quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

OCIDENTE EVITA TRATADO SOBRE DIREITOS DE MIGRANTES

 

Thalif Deen 
A Organização das Nações Unidas (ONU) celebrará amanhã o Dia internacional do Migrante fazendo uma exortação no sentido de ampliar a vigência de uma Convenção de 1990 que protege os direitos destas populações, em um momento em que uma onda de xenofobia se estende pela Europa e pelos Estados Unidos.
O chamado do secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, foi dirigido principalmente aos países ocidentais, que abrigam mais de 215 milhões de imigrantes e se negam a ratificar o tratado que os obrigará a oferecer segurança e protecção aos trabalhadores estrangeiros. “A situação irregular de muitos migrantes não os priva de sua humanidade nem de seus direitos”, disse Ban ao se referir à data.
A Convenção Internacional sobre a Protecção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migratórios e de seus Familiares foi assinada em 1990 e entrou em vigor em julho de 2003, com a ratificação de 20 países, a maioria deles fonte de trabalhadores emigrantes, como Argélia, Egipto, Filipinas, Gana, Marrocos, México, Sri Lanka e Turquia.
Entre os países ocidentais que evitam este tratado estão vários dos maiores receptores de população estrangeira, como Alemanha, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha e Itália. Em um documento de 48 páginas, divulgado na sede da ONU em Nova York, a organização humanitária Human Rights Watch (HRW) pediu aos governos que em 2011 se dediquem a melhorar as medidas de protecção dos imigrantes, por exemplo, ratificando a Convenção.
Muitos governos agravam as coisas com políticas que exacerbam a discriminação ou que impedem os imigrantes até mesmo de recorrerem às autoridades em busca de ajuda, disse a pesquisadora da HRW, Nisha Varia, especializada em direitos das mulheres. As políticas migratórias e a falta de protecção legal colocam os imigrantes em maior risco de abusos, como exploração trabalhista, violência, tráfico de pessoas, maus-tratos e torturas quando são detidos, e até assassinatos, alertou Nisha. E estes países oferecem pouquíssimos recursos para reclamar justiça, acrescentou.
A crescente fobia contra os estrangeiros é evidente em boa parte da Europa ocidental (Alemanha, França, Itália e Suíça) e também nos Estados Unidos. À pergunta da IPS sobre a queda na remessa de dinheiro que os trabalhadores enviam para suas famílias, causada no último ano pela crise económica mundial, Nisha insistiu que “os governos devem proteger os direitos humanos dos migrantes sem importar se suas contribuições aumentam ou diminuem”. Além disso, combater infracções trabalhistas muito comuns, como o não pagamento de salários, tem efeitos económicos positivos, completou.
Em tempos de penúria, a população de um país pode culpar os estrangeiros de ficarem com seus empregos, mesmo em se tratando de trabalhos que ela não esteja disposta a executar, disse Nisha. Por isso, “os governos devem enfrentar os sentimentos xenófobos que levam à discriminação e à violência”, acrescentou a especialista da HRW. Segundo o Banco Mundial, as remessas de dinheiro feitas pelos trabalhadores imigrantes para os países em desenvolvimento chegaram a US$ 278 bilhões em 2007 e a US$ 325 bilhões em 2008, mas no ano passado caíram para US$ 307 bilhões.
Os países mais afectados foram Moldávia (leste europeu), Quirguistão e Tajaquistão (Ásia central), onde a queda da renda por remessas representou entre 8% e 16% do produto interno bruto, segundo o informe “Situação Económica Mundial e Perspectivas 2011”, divulgado parcialmente no dia 1º e que será apresentado integralmente na primeira semana de Janeiro.
Em várias nações centro-americanas e caribenhas, entre elas o Haiti, o impacto da redução de remessas ficou entre 1% e 2% do PIB, enquanto em países do sudeste europeu oscilou entre 2% e 3%. Contudo, o Banco Mundial adianta que os números finais de 2010, que serão computados no final do mês, estariam na casa dos US$ 325 bilhões. Espera-se que esta tendência de alta continue para chegar em 2012 com US$ 374 bilhões.
A HRW afirma que muitos países dependem da mão-de-obra estrangeira para realizar trabalhos mal pagos, perigosos ou informais. Além disso, em seu informe documenta exploração trabalhista e obstáculos para indemnizar imigrantes na agricultura, no serviço doméstico e na construção nos seguintes países: Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Estados Unidos, Indonésia, Malásia, Cazaquistão, Kuwait, Líbano e Tailândia.
“Os sistemas de apoio à imigração de muitos países concedem aos empregadores um imenso controle sobre os trabalhadores e deixam estes presos em situações abusivas ou impossibilitados de reclamar reparações na justiça”, diz o informe. Nos Estados Unidos, centenas de milhares de pessoas são detidas durante meses, inclusive anos, por violarem normas migratórias de carácter civil. Sem direito a um advogado nomeado pelo Estado, quase 60% dos imigrantes detidos comparecem aos tribunais sem defesa legal neste país.
A HRW também afirma que, para os imigrantes com deficiências mentais, a falta de um advogado determina que não podem defender seus direitos. Alguns permanecem detidos sem justificativa durante anos. A Organização Internacional para as Migrações (OIM) afirmou que muito frequentemente as contribuições que os migrantes dão à sociedade são questionadas ou ignoradas, pois muitos governos adoptam condutas reducionistas, apresentando-os como uma carga para economias debilitadas ou como uma drenagem constante dos serviços sociais prestados pelos Estados.
Um estudo divulgado este ano pelo University College London revela que os recém-chegados à Grã-Bretanha, procedentes da Europa oriental, pagaram, proporcionalmente, 37% mais impostos do que os benefícios que receberam dos serviços públicos no período 2008-2009. Muitos imigrantes também contribuíram com a assistência de saúde, como pessoal médico, de enfermaria e limpeza no Serviço Nacional de Saúde do país.
Nos Estados Unidos, os cidadãos naturais se beneficiam com cerca de US$ 37 bilhões por ano, injectados na economia nacional pela actividade dos imigrantes, segundo o Conselho de Assessores Económicos da Presidência. Mais de um em cada dez trabalhadores autônomos dos Estados Unidos são imigrantes, segundo a OIM. Entretanto, apesar das provas, “poucos assuntos despertam reacções mais duras do que a migração”, disse o director-geral dessa organização, William Lacy Swing.
“Dos parlamentos até as ruas, passando pelas discussões na hora do jantar, acontecem acesos debates sobre o impacto dos imigrantes na identidade nacional, na segurança, no emprego, na saúde e nos serviços sociais, todos elementos que formam a fábrica da sociedade”, acrescentou William. Muitas discussões se baseiam em emoções e mitos, e não em realidades sociais e económicas.
“As migrações, agora e no futuro, obedecem a tendências económicas, sociais e demográficas globais que já não podem ser ignoradas”, acrescentou o director da OIM. Uma das razões de seu acentuado aumento é a queda populacional nos países industrializados, que poderá chegar a 25% em 2050, afirmou William. Isto ampliará significativamente a demanda por trabalhadores migrantes enquanto a força de trabalho dos países em desenvolvimento passará dos 2,4 bilhões, em 2005, para 3,6 bilhões em 2040. Envolverde – IPS

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domingo, 5 de dezembro de 2010

IMIGRANTES NOS AÇORES

Aníbal Pires associa neste trabalho o conhecimento académico à paixão humana pelas Migrações. O conhecimento académico está plasmado ao longo destas páginas revelando novas facetas do fenómeno nos Açores – um contributo valioso para a nossa história de emissão e recepção de migrantes – com todos os cruzamentos científicos emergentes e difusores desse movimento fascinante. A paixão está na palavra, no olhar, na perspectiva, na emoção que hoje alguns investigadores defendem dever aproximar-se do estudo para lhe conferir novos sentidos.
Os imigrantes que a Região de nove ilhas formada acolhe, as suas motivações, os seus percursos, as avaliações e as representações que têm vindo a construir acerca da(s) sociedade(s) de acolhimento, com as suas culturas locais, foram o campo onde Aníbal Pires trabalhou, sem trair a sua matriz ideológica que, naturalmente, o levou a referenciar novas formas de discriminação e desigualdades tendentes à exclusão que hoje surgem em consequência de vários factores entre os quais a globalização que atinge também os Açores e a sua ultraperificidade – ainda factor de isolamento.
Em contrapartida, também nestas ilhas se reflectem práticas de integração já reconhecidas e convergentes com o esforço estratégico de inserção a nível nacional. Mas Aníbal Pires prefere dar voz aos actores das migrações para a análise do processo que já transformou a face dos Açores e lhe ofereceu uma nova e diversificada dinâmica cultural. Ao incorporar a auto análise dos agentes migratórios, o autor liberta vozes muitas vezes silenciosas e tímidas porque vulneráveis ou fragilizadas pelo actual decréscimo de possibilidades de mão-de-obra.
Obrigada, Aníbal Pires, por este livro e pela correcção com que as teorias servem a apresentação desta nova realidade, central no mundo, relevante nos Açores. (Alzira Serpa Silva)

Nota: o livro pode ser adquirido aqui

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

MORTE NA FRONTEIRA

morte na fronteira

A notícia é estarrecedora: 72 pessoas, incluindo homens e mulheres, são encontradas mortas em San Fernando, estado de Tamaulipas, México, a 160 km ao sul de Browsville, Texas, Estados Unidos.

Não é a primeira vez que os emigrantes/imigrantes, atraídos e iludidos por organizações internacionais, encontram uma morte trágica nas zonas fronteiriças entre os países pobres e os países ricos. Bastaria um olhar retrospectivo às últimas décadas para dar-se conta de quantas pessoas já foram barbaramente assassinadas ou morreram na travessia de desertos, florestas e mares que ligam o mundo desenvolvido ao mundo subdesenvolvido. Testemunhas disso são, por exemplo, Ciudad Juárez, no México; mar Mediterrâneo, entre África e Europa; mar do Caribe com golfo mexicano; e Istambul, como elo de ligação entre Ásia e Europa.

Enquanto as mercadorias, o capital, a tecnologia e os serviços têm livre trânsito , os trabalhadores encontram inúmeras barreiras, seja do ponto de vista legal, seja do ponto de vista socioeconómico e cultural.

Fronteira se torna, ao mesmo tempo, terra de ninguém e terra aberta a todas as possibilidades. Ali se mesclam e se confundem distintas línguas, bandeiras, moedas e povos de todas as raças e culturas. Ali tensões, conflitos e solidariedades convivem lado a lado. Sonhos e pesadelos cruzam e recruzam de um país para outro. Desfilam por esse terreno minado os pés ansiosos e os olhares esperançosos de imigrantes, exilados, refugiados, deportados, entre outros.

Autoridades policiais, "coyotes" e quadrilhas do tráfico disputam pessoas e dólares. Os migrantes se convertem, simultaneamente, em vítimas, problemas, e sujeitos. Vítimas, na medida em que são duplamente explorados: pelas redes criminosas encarregadas de vender falsas ilusões aos jovens do terceiro mundo que buscam um futuro mais promissor e pelos governos ou empresários que necessitam dessa mão-de-obra barata para os serviços mais sujos e pesados, perigosos e mal remunerados.

Nesse sentido, a fronteira não deixa de ser um símbolo de tais transformações económicas, políticas, sociais e culturais. Quem passa pela experiência de fronteira - vale dizer, de não lugar - tende a estar mais aberto a uma reestruturação do conceito de cidadania. Se aqueles que nascem em berço de ouro costumam ter receio de mudanças, quem experimenta a insegurança e o vaivém do caminho e da área indefinida da fronteira as anseiam e as buscam. São protagonistas da esperança. Em semelhante perspectiva, o não lugar da fronteira pode converter-se no melhor lugar para lançar as raízes de um novo lugar. A experiência da estrada e da terra de ninguém, ou seja, da transitoriedade e da provisoriedade, podem abrir uma porta privilegiada para a vontade de mudanças profundas e estruturais.

Excertos de “Morte na Fronteira”, publicado por Adital

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quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

A REVOLTA DOS INTRUSOS


Xenofobia é território de estudo do peruano Danilo Martuccelli, professor de sociologia na Universidade Lille 3, emFrança. Para esse tema dedicou não só teses académicas, mas um livro (Racisme et Xenophobie en Europe, ed. La Découverte). Na entrevista que se segue, o professor analisa o impacto da legislação da UE sobre os países membros, ao mesmo tempo que tenta explicar o endurecimento legal, de um lado, e as perspectivas de milhões que vivem em situação de vulnerabilidade e incerteza, de outro. (Só de brasileiros, são 2,7 milhões os que deixaram o País). Fala dos medos sociais que capturam o imigrante e fazem sua expiação. Ataca o economicismo que cega parlamentos e governos na busca de soluções. E chama atenção para o aumento de mulheres deixando seus países de origem: “Emigrar já não é mais um projecto masculino”.


O endurecimento das leis de imigração na UE, constrangimentos sofridos por brasileiros em aeroportos, a morte violenta de um jovem do Sul do País numa rua de Madrid. Enfim, o “vento frio da xenofobia” está mesmo soprando no continente europeu, como diz o presidente Lula?
O que se viu nos últimos anos e o que se vê neste momento, com essas leis, é que a gestão de imigração no continente europeu obedece a dois critérios. Primeiro: o imigrante ameaça a segurança interna, portanto, é assunto da polícia. Segundo: querem ver a imigração exclusivamente sob a óptica económica, como forma de se garantir ingresso de mão-de-obra, suprindo dificuldades demográficas. Essas duas visões, extremamente redutoras, não incorporam as dimensões social, cultural e humana da imigração. Ao contrário, transformam o imigrante no bode expiatório dos medos sociais.

Que medos são estes?
Vários. Mas o primeiro deles, a meu ver, tem índole demográfica. Em 1900, a Europa reunia aproximadamente 20% da população do planeta. Hoje tem 11%. Em 2050 terá 4%. Parece evidente que nos próximos anos a região terá de passar por algumas ondas migratórias.

Os incentivos à natalidade não estão dando resultado?
Em países onde se harmonizou a vida profissional das mulheres com as demandas do trabalho doméstico e familiar, os incentivos tiveram resposta. São lugares com taxas de natalidade aceitáveis. É o que se observa hoje na França e em países escandinavos. Mas nos países em que se desestimulou o trabalho feminino fora de casa encontram-se taxas de natalidade particularmente baixas. É o que se vê pelo Leste Europeu e em países da Europa latina, como Portugal e Espanha. Na Grécia, também. Nesses lugares, encontra-se a “greve do ventre”, ou seja, as mulheres evitam ter filhos para desenvolver alguma actividade remunerada.

Que outros medos compõem a expiação do imigrante?
Durante muito tempo a Europa se baseou num modelo de desenvolvimento que buscava, ao mesmo tempo, a eficácia de mercado e a regulação do Estado sobre a economia. Esse modelo variou de país para país, mas, essencialmente, dependia de algo chamado “coesão social”. O que se viu nos últimos anos? A coesão europeia foi tremendamente desestabilizada pela globalização no mundo do trabalho. Assistimos a um crescente empobrecimento das classes médias e o surgimento de vulnerabilidades nos sectores populares. Isso dá origem a uma ansiedade que acaba por traduzir-se em intolerância aos de fora. Um outro medo se articula em torno da ideia de nação. Até pela configuração da UE, as nações europeias sentem-se ameaçadas. Mas por quem? Pelo quê? Por um projecto europeu e por nacionalismos que estão pipocando. A desestabilização vem daí: uma nação, seja ela alemã, francesa ou espanhola, tem que dar lugar a uma cidadania europeia, ao mesmo tempo em que lida com regionalismos reactivados. Eis por que o imigrante transformou-se num ponto focal da política europeia.

Hoje milhares de brasileiros estão ao alcance das sanções da nova legislação europeia. Voltando aos anos 80, nossa década perdida, veremos que o fluxo migratório brasileiro deu um salto naquele período e no início dos anos 90. Só que no período subsequente, a economia brasileira ganhou estabilidade e hoje as perspectivas são boas para o País. Por que, então, as pessoas continuam saindo?
Há pelo menos três razões fundamentais para emigrar, sem querer simplificar a reposta. A primeira, e mais evidente, é a dificuldade económica no país de origem. Porém os que saem não são necessariamente os mais pobres, e sim os mais frustrados. A segunda razão é a perseguição política. Sobretudo na África subsaariana, muitos deixam o país de origem tocados por ditaduras. Desgraçadamente, os refugiados ainda constituem um contingente imenso. A terceira razão tem a ver com o fato de que o mundo do trabalho tornou-se altamente competitivo. Profissionais especializados, como arquitectos, designers, gente da área de finanças, defrontam-se com um mercado de oportunidades atractivo e móvel. Com os investimentos sucessivos em educação nos últimos anos e com esse mercado global aberto para especialistas, encontramos a explicação de por que as classes médias latino-americanas emigram. E há, por fim, uma quarta razão: a imigração continua sendo uma aventura pessoal.

O senhor diz que não são os mais pobres que emigram, mas os mais frustrados. Qual é a diferença?
Os mais frustrados é que saem. Aqueles que, diante de uma péssima distribuição de riquezas e da falta de oportunidades, se desencantam. A desigualdade é um aliciante muito forte. Agora, se me permite, quero ressaltar um outro fenómeno: durante muito tempo a emigração foi um projecto essencialmente masculino. Agora, e cada vez mais, são as mulheres que emigram, levando na bagagem um projecto pessoal. Elas já não saem de seus países para encontrar o cônjuge. Partem por conta própria. Há as solteiras, dispostas a uma nova vida. E há as mulheres mães que partem em busca de oportunidades de trabalho, para gerar remessas que mandam ao país de origem, ajudando a criar os filhos. Esse fenómeno merece nossa atenção.

Existe uma ideologia racista no continente europeu?
Se ligo o barómetro, vejo que essa ideologia pressiona apenas uma pequena parcela dos europeus. Gente de extrema direita. Você pode perguntar: existe um racismo popular difundido na Europa? Infelizmente, sim. O racismo popular é uma mescla de coisas. Tem o racismo biológico, do tipo “sou melhor indivíduo que o outro”; o racismo de carácter cultural, difundindo que o diferente é impossível de ser assimilado; e o racismo por competição económica, “não quero que o outro venha porque vai tirar meu lugar”.

E os preconceitos? na imprensa espanhola lê-se que as brasileiras desembarcam em Madrid para viver como prostitutas. Os imigrantes do Leste Europeu são identificados com a máfia. Os africanos, com gente violenta.
Preconceitos sempre existiram. E existirão sempre. São como uma regra universal da história humana, segundo a qual um grupo social se valoriza às custas de rebaixar o outro. Só que, hoje, além de se propagar com incrível rapidez, os preconceitos estão mais fortes. Observe o seguinte: nas periferias de muitas cidades europeias, onde existe uma coabitação real de imigrantes e europeus, estouram conflitos inter-étnicos e de competição económica muitas vezes violentos. Mas os estereótipos são menos fortes, porque existe coabitação. Um vê o outro. Já os estereótipos que se propagam pelos veículos de comunicação de massa, sem contacto com a realidade, tendem a gerar preconceitos mais nocivos e perigosos. Como combatê-los? A única forma é fazer com que as coisas funcionem, é melhorar a situação do emprego, da habitação, saúde, educação, integração cultural. Posso explicar a importância da coabitação com um exemplo meio estranho. Há homens que são misóginos, mas, a despeito de sua misoginia, casam-se com mulheres. Não fosse assim, a espécie humana já teria desaparecido. Mas isso prova que o preconceito não necessariamente evita a relação com o outro.
(excerto da entrevista do sociólogo peruano Danilo Martuccelli)