quarta-feira, 6 de maio de 2009

SILÊNCIOS QUE GRITAM (I) - SONHOS NO EXÍLIO


O exílio é um daqueles silêncios que gritam, apesar das ambiguidades, dos pensamentos ausentes, das lágrimas vestidas de raiva, e da impotência acomodada. As ausências e os silêncios preenchem o quotidiano do exilado/emigrante em territórios polvilhados de nostalgia e de recusa e ostracismo explícitos.
Politicamente refractários, perseguidos ou indiferentes, percorrem as ruas da sobrevivência, em nome duma amnésia histórica adquirida. As tragédias pessoais dilatam-se ou contraem-se como vasos dum corpo social imunodeficiente.
A reprodução e o regresso ao passado desperta-os desta letargia mal diagnosticada.
A crise identitária, de uns, é compensada pelo pragmatismo doutros.
Pedreiros, estudantes, mulheres a dias, funcionários públicos, freiras e prostitutas, políticos de todos os quadrantes, quadros superiores, músicos, desportistas representam esta multidão difusa, heterogénea e desconfortável numa temperatura social mais fria, mais distante, menos solidária, diferente!
Outro continente, outras gentes, e uma coexistência difícil. A geografia e a unidimensionalidade cultural repercute-se em todos os domínios da existência separadora, inevitavelmente!
Do local de trabalho ao bairro, passando pelos transportes públicos, os pesadelos do passado, ressurgem como num filme a preto e branco: “ Minha raça sou eu mesmo. A pessoa é uma humanidade individual. Cada homem é uma raça, senhor policia”(Mia Couto)
Milhares que vivem em situação de vulnerabilidade e incertezas, são invadidos pelo desalento, pela frustração e pelo desencanto e pelos medos que capturam a esperança! Como eram enormes as expectativas geradas!
Revisitar as origens, familiares e amigos, cheiros, sabores e tantos lugares e afectos, percorrem, e preenchem, os sonhos do exilado:
Maputo e Mafalala;Quelimane e Namacurra; Beira e Manga; caril de amendoim, e mucuane, sura , caju e aguardente; mangas e papaias; Pemba e Paquitequete , Inhambane , Chidinguele; caranguejo e camarão; Ibo e café, galinha à zambeziana, xigubo, msaho mapiko, Malangatana, Craveirinha, Mia Couto Fanny Pfumo, Paulina Chiziane,mafurra, praias, pescadores mineiros e o coração grande e generoso dos compatriotas, moçambicanos.

1 comentário:

  1. Caro Agry
    Meu amigo, gostei muito do texto e da finalidade do blog. Bem sei o que é sentir todas essas sensações de exílio. Ainda são as minhas companheiras cotidianas, pois, se de um lado cessou a urgência política, doutro cresceu a consciência temporal e de uma nova qualidade à memória.
    Um dia quando tiver mais tempo, enviar-te-ei alguns curtos textos que fiz a contar sobre isso tudo.
    Meu cumprimentos e boa sorte com o blog.

    ResponderEliminar

Os comentários feitos pelos visitantes não deverão conter linguagem ofensiva, na forma e conteúdos, e poderão ser removidos se violarem este espírito.
Entretanto,surgiram comentários sem qualquer relação com as respectivas postagens,o que é profundamente lamentável.Assim,decidi reactivar a moderação de comentários facto que,aliás, me desagrada sobremaneira